terça-feira, 29 de maio de 2012

COMPENSAÇÃO DE ACORDO COM A LEI 12.431/2011


COMPENSAÇÃO DE PRECATÓRIOS

A Portaria Conjunta PGFN/RFB 9, de 19/10/2011, que regulamentou o artigo 43 da Lei 12.431/2011, autorizou a amortização das parcelas vencidas (art. 1º, § 3º, I) e vincendas (art. 1º, § 3º, II) do “REFIS DA CRISE/SUPER REFIS” com créditos de precatórios federais titulados pelos contribuintes optantes de quaisquer das modalidades de parcelamentos previstos na Lei nº 11.941/2011.

O artigo 1º da mencionada portaria prevê:

“Art. 1º O sujeito passivo optante pelas modalidades de parcelamento previstas nos arts. 1º, 2ºe 3º da Lei nº 11.941, de 2009, e que consolidou os débitos objeto de parcelamento ou de pagamento à vista com utilização de créditos decorrentes de Prejuízo Fiscal ou de Base de Cálculo Negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, de que tratam os artigos 15 e 27 da Portatia Conjunta PGFN/RFB nº 6 de 2009, poderá amortizar o saldo devedor das modalidades de parcelamento com créditos de precatório de sua titularidade a serem pagos pela União.

§ 1º Considera-se titular do precatório o credor originário.

§ 2º A amortização de que trata o art.43 da Lei nº 12.431, de 2011, aplica-se a precatórios expedidos, inclusive àqueles expedidos anteriormente à Emenda Constitucional nº 62, de 9 de dezembro de 2009;

§ 3º A amortização não exime o sujeito passivo do pagamento das prestações mensais, exceto se ocorrer a liquidação integral das modalidades de parcelamento, e será efetuada, sucessivamente:

I – na ordem crescente da data de vencimento das prestações vencidas;

II – na ordem decrescente da data de vencimento das prestações vincendas.

§ 4º Somente poderão ser objeto da amortização de que trata este artigo os débitos perante a mesma pessoa jurídica devedora do precatório.

A partir de tal Portaria passou o contribuinte a ter o direito de liquidar as parcelas vencidas dos seus parcelamentos mediante compensação com precatórios. Como até a presente data nem a RFB nem a PGFN disponibilizaram em seus sistemas informatizados mecanismos que possibilitem ao contribuinte exercer o direito que desde 19/10/2011 lhe está assegurado, as compensações têm de se processar através de pedidos administrativos dos quais obrigatoriamente gera o efeito de suspender a exigibilidade das prestações pretendidas quitar.

O contribuinte, desde 19/10/2011 possui o direito de se beneficiar da previsão legal contida na Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9 independentemente de os sistemas da RFB/PGFN estarem ou não parametrizados para operacionalizar tal operação.

Tal direito deve ser exercido através de requerimentos administrativos formalizados perante os respectivos órgãos, instruídos e respeitando as formalidades reclamadas pela citada Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9, requerimentos estes que enquanto estiverem pendentes de apreciação por parte da administração devem suspender a exigibilidade das prestações através deles liquidadas, e isto porque consoante prevê o art. 6º da referida Portaria a amortização que por força dos referidos requerimentos será deferida retroagirá à data do protocolo do requerimento.

Prevendo a norma que a amortização retroagirá à data do pedido, é óbvio que do requerimento de amortização formulado com fundamento no artigo 1º, caput, e § 3º, I, da Portaria Conjunta SRF/PGFN nº. 09/2011 gera o efeito suspensivo sobre as parcelas através dele pretendidas amortizar.

O  requerimento de amortização pendente de julgamento, autoriza a pretensão declinada pelo contribuinte e em seu art. 8º, que não vindo a se concretizar a amortização o parcelamento será restabelecido e as parcelas não quitadas deverão ser liquidadas em 30 dias.

Daí temos:

1. A composição subjetiva do processo tributário- responsabilidade tributária: situações polêmicas



2. “Operações” com precatórios no contexto da compensação da EC 62/2009 e da Lei nº 12.431/2011



3. Exceção de pré-executividade e regime de provas – semelhanças com o mandado de segurança. Possibilidade de aplicação subsidiária dos princípios do mandado de segurança. Suspensão da execução e suspensão da exigibilidade e suas possibilidades.



A atual redação do art. 100, § 9º de nossa CRFB/88, alterada pela retromencionada emenda, permite expressamente a compensação dos precatórios pelo “valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial”.



Na interpretação feita pelo ministro Gilmar Mendes, Inocêncio Mártires e Paulo Gustavo (2007, 524), trazendo à baila o método “Anspruch auf rechtliches Gehör”, ou seja, pretensão à tutela jurídica, os princípios do contraditório e da ampla defesa serão devidamente aplicados quando observados os seguintes direitos:

Direito de informação (Recht auf Information), que obriga o órgão julgador a informar à parte contrária aos atos praticados no processo e sobre os elementos dele constantes;

Direito de manifestação (Recht auf Äusserung), que assegura ao defendente a possibilidade de manifestar-se oralmente ou por escrito sobre os elementos fáticos e jurídicos do processo;

Direito de ver seus argumentos considerados (Recht auf Rerücksichtigung), que exige do julgador capacidade de apreensão e isenção de ânimo (Aufnahmefähigkeit und Aufnahmebereitschaft) para contemplar as razões apresentadas” (grifos nossos).

A nomeclatura adotada pelo direito positivado brasileiro deita raízes no ordenamento jurídico francês, como bem atenta Hugo de Brito Machado (2003, 115) em sua magnânima obra:

“Diversas têm sido as denominações utilizadas pela doutrina para designar o fato gerador. Entre outras: suporte fático, situação base de fato, fato imponível, fato tributável, hipótese de incidência. No Brasil tem dominado, porém, a expressão fato gerador, que se deve à influência do Direito francês, sobretudo pela divulgação, entre nós, do trabalho de Gaston Jèze, específico sobre o tema”.

O instututo também é encontrado em diversos outros ordenamentos jurídicos, como bem atenta o ilustre Jamens Marins (2010, 80), in verbis.

“O lançamento tributário, denominado de ‘liquidación’ na doutrina espanhola, ‘determinación’ na doutrina argentina e de ‘accertamento’ na italiana, é ato administrativo de aplicação de norma material.”

O lançamento possui natureza meramente declaratória, mormente porque vinculado a uma obrigação principal constitutiva, aquela que insurge na simples ocorrência do fato gerador. É esta a mens legislator do art. 139 do CTN, in verbis.

“Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta.”

Adentrando, finalmente, no conceito de Dívida Ativa, imprescindível se faz a menção ao disposto no art. 201 do Código Tributário Nacional, ips litteris.

“Art. 201. Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular.”

é cediço que o ente da Administração Pública possui o direito de efetuar a compensação pela previsão legal do art. 170 do Código Tributário Nacional, o sujeito credor da Fazenda Pública possui garantia igual prevista na própria Carta Magna, como bem leciona Hugo de Brito Machado (2003, 196-197), ips litteris.

“A Constituição Federal de 1988 diz que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento, entre outros, a cidadania. Coloca entre os princípios fundamentais de nossa República o de construir uma sociedade livre, justa e solidária. Diz que todos são iguais perante a lei, e que são garantidos os direitos, entre os quais o direito à propriedade. E estabelece, ainda que a Administração obedecerá aos princípios que enumera, dentre os quais o da moralidade.

Vê-se, pois, que pelo menos cinco são os fundamentos que se encontram na Constituição para o direito à compensação de créditos do contribuinte com seus débitos tributários”.

Contudo, a jurisprudência inclina-se no sentido de que tal compensação só poderá ser efetuada se lei local dispuser sobre o assunto, senão vejamos:

“CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. DÉBITO FISCAL. COMPENSAÇÃO. PRECATÓRIO. PRESSUPOSTO. AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA. AUSÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE.

De acordo com reiterada leitura pretoriana do art. 170,caput , do Código Tributário Nacional, a compensação de crédito tributário só é possível quando expressamente prevista na lei local, inclusive para fins do art. 78, § 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

No âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a Lei Estadual nº 11.472/00, que autorizava a utilização de precatórios para a compensação de créditos inscritos em dívida ativa, foi revogada pela Lei Estadual nº 12.209, de 29.12.2004.”. (TJRS – 22ª Câmara Cível – AC 70044836112 – Rel. Des. Mara Larsen Chechi – j. 29.02.2012).

Atenta Hugo de Brito Machado (2003, 197), contudo, que “a Fazenda Pública vem praticando a compensação sempre que tem de pagar alguma quantia a alguém. Compensa até créditos seus sabidamente desprovidos de liquidez e certeza”.

A compensação passara a se tornar, predominantemente, automática no curso da demanda judicial, ainda que o favorecido do precatório não demonstre interesse na compensação, o que, consoante dito preliminarmente, poderá acarretar em injustiças ante compensações indevidas com títulos desprovidos da devida certeza.

O art. 170-A do CTN, incluído pela Lei Complementar 104/2001 viera consignar a vedação de compensação nos casos em que o crédito da Fazenda Pública é contestado em vias judiciais, ips litteris.

“Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial”.

O ilustre doutrinador Hugo de Brito Machado Segundo (2006, 121) determina que a sobredita norma somente se aplica às hipóteses nas quais o sujeito passivo pretende utilizar, na compensação, um crédito que entende possuir, relativo ao pagamento de um tributo cuja validade ainda é discutida judicialmente”.

Observa-se que, ainda que sob a premissa do interesse público, o Estado vê-se em situação de recusar – em verdade, trata-se de vedação obrigatória – a compensação quando ainda duvidosa a certeza e liquidez de seu próprio débito, contudo, o administrado não goza da mesma garantia, in thesis, pois, por mais que o art. 100, § 9º da CRFB mencione a necessidade de o crédito da Fazenda Pública ser certo e líquido, abre margem para dúbia interpretação ao permitir que mesmo dívidas não inscritas na Dívida Ativa podem ser compensadas.

4. Da Inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº. 62/2009

A Emenda Constitucional nº. 62 de 9 de dezembro de 2009 trouxera nova redação ao art. 100 da Constituição Brasileira, dentre os seus parágrafos, devemos atentar ao § 9º, in verbis.

“§ 9º No momento da expedição dos precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial”. (grifos nossos)

De se observar, neste momento oportuno, os termos ressaltados na transcrição supra. A utilização do verbo “deverá” implica na obrigatoriedade da medida, de sorte que, ad primo, não se vislumbra permissão ao sujeito passivo o direito de manifestação nos autos do processo judicial negando-se a ver seu crédito compensado.

De maneira até contraditória, o § 9º do art. 100 da Lei Maior estabelece que o crédito fazendário deverá ser líquido e certo. Contudo, como dispõe o art. 204, caput, do Código Tributário Nacional, dispositivo estampado no Capítulo II, “Dívida Ativa”, “a dívida regularmente inscrita goza de presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída”.

Ou seja, a liquidez e certeza são constituídas não no momento do fato gerador ou do lançamento tributário, mas sim no ato de inscrição do débito na Dívida Ativa. Portanto, como pode o § 9º do dispositivo constitucional conceber a possibilidade de débitos ainda não inscritos gozarem desta presunção?

A questão da inconstitucionalidade é tangível neste ponto, porquanto seja o art. 204 um corolário do princípio da isonomia, da igualdade e da moralidade pública, princípios constantes em nossa Carta Magna. Dispor contra sua literalidade seria afrontar diretamente garantias constitucionais dogmatizadas como cláusulas pétreas em nosso ordenamento.

Se o precatório é oriundo de uma decisão com trânsito em julgado, por que haveria de ser compensada por crédito cuja certeza fora atestada somente em uma estrita via administrativa e, in thesis, passível de contestação em processo judicial próprio? Nos dizeres do desembargador do TRF da 4ª Região, Otávio Roberto Pamplona, “há aí, sem dúvida, ofensa ao princípio do devido processo legal”[9].

A Lei 12.431/2011 dispõe com pormenores o procedimento de compensação dos precatórios pelos pretensos créditos fazendários, tal regramento está delineado no art. 30 e seguintes da supramencionada Lex. Data venia para a transcrição da literalidade do art. 36, caput.

“Art. 36. A compensação operar-se-á no momento em que a decisão judicial que a determinou transitar em julgado, ficando sob condição resolutória de ulterior disponibilização financeira do precatório”.

Tal dispositivo encerra a questão referente à prescindibilidade do aceite do credor, que não poderá recusar-se a ver seu precatório compensado pelo crédito da Fazenda Pública.

Ora, a discussão referente à (in)constitucionalidade do art. 100, § 9º da Constituição Federal – incluído pela EC 62/2009, ressalte-se – vem inflamando a discussão entre os juristas desde o início de 2011, tendo como estopim decisão inaugural do Tribunal Regional Federal da 4ª Região no sentido de declarar a inconstitucionalidade da norma em via de controle concentrado de constitucionalidade[10].

Não somente o § 9º do supramencionado artigo é posto em comento, como também a alteração feita ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, determinando a inclusão de um art. 97 dispondo de maneira contrária ao direito adquirido, ips litteris.

“Art. 97. Até que seja editada a lei complementar de que trata o § 15 do art. 100 da Constituição Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que, na data de publicação desta Emenda Constitucional, estejam em mora na quitação de precatórios vencidos, relativos às suas administrações direta e indireta, inclusive os emitidos durante o período de vigência do regime especial instituído por este artigo, farão esses pagamentos de acordo com as normas a seguir estabelecidas, sendo inaplicável o disposto no art. 100 desta Constituição Federal, exceto em seus §§ 2º, 3º, 9º, 10, 11, 12, 13 e 14, e sem prejuízo dos acordos de juízos conciliatórios já formalizados na data de promulgação desta Emenda Constitucional.”

Outro ponto costumeiramente atacado quando se almeja a declaração de inconstitucionalidade das alterações obradas pela EC é a de um possível vício formal, oriundo do desrespeito ao art. 60, § 2º da CRFB/88, que prevê o procedimento legislativo obrigatório de discussão e votação em das emendas à Constituição em dois turnos em cada casa do Congresso Nacional, sendo que, fatidicamente, todas estas votações ocorreram e se concentraram em um único dia.

Contudo, estas questões que tangem ofensas ao direito adquirido e ao devido processo legislativo não serão objetos de estudo nesta obra, não desmerecendo a inconteste importância de seus apontamentos para mais claramente se vislumbrar a inconstitucionalidade da emenda em debate.

A eficácia erga omnes e presunção de constitucionalidade do art. 100, § 9º da CRFB/88 não é prejudicada quando das decisões isoladas do controle incidental, todavia, o constante afastamento nos casos concretos demonstram a necessidade de posicionamento definitivo da Corte Suprema. Tracemos, portanto, posicionamento hodierno da jurisprudência pátria.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, provocado a manifesta-se incidentalmente acerca da constitucionalidade da matéria da EC 62/2009 decidira por declarar sua inconstitucionalidade, senão vejamos:

“MANDADO DE SEGURANÇA - PRECATÓRIO - PEDIDO DE SEQÜESTRO EXTINTO - EMENDA CONSTITUCIONAL 62/2009 INCONSTITUCIONALIDADE - Mandado de segurança impetrado contra decisão que extinguiu pedido de sequestro com base no novo regramento advindo da Emenda Constitucional nº 62/2009. Inconstitucionalidade declarada pelo Colendo Órgão Especial desta Egrégia Corte. Ordem concedida.” (TJSP – Órgão Especial – MS 4786903220108260000 – Rel. Des. Roberto Mac Cracken – j. 11.05.2011). (grifos nossos)

O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por sua vez, adotara posição apontada como mais cautelosa – não mais acertada, contudo[11] – decidindo por aplicar as alterações contidas na Emenda até ulterior posicionamento do STF contrariando a sua presumida constitucionalidade.

“MANDADO DE SEGURANÇA - PEDIDO DE COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO DE PRECATÓRIO COM DÉBITO TRIBUTÁRIO - DECISÃO QUE EXTINGUIU O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO FATO SUPERVENIENTE - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 62/2009 E DECRETO ESTADUAL Nº 6.335/2010 NOVO REGIME DE PAGAMENTO DE PRECATÓRIOS - APLICAÇÃO AOS PROCESSOS EM CURSO - AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL CONFIGURADO - SÚMULA 20, DO ÓRGÃO ESPECIAL - INCONSTITUCIONALIDADE DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 62/09 - AFASTAMENTO. RECURSO DESPROVIDO.

(...)

2 - Com relação à alegada inconstitucionalidade da EC nº 62/2009, denota-se que, até o momento, não houve qualquer manifestação do Supremo Tribunal Federal na ADI nº 4.357, estando referida norma, pois, em pleno vigor. Ademais, na esteira dos argumentos constantes do voto-vista da Ministra Ellen Gracie, proferidos na ADI nº 2.362, não há que se falar em inconstitucionalidade da EC nº 62/09, porque o parcelamento não se constitui em uma negativa de pagamento dos precatórios, mas em um mecanismo de readequação das finanças dos entes da federação para que, após o ajuste dos valores acumulados à realidade dos cofres públicos, possam quitar os precatórios devidos, atendendo, dessa forma, ao interesse público”. (TJPR – Órgão Especial – AGR 661846002 – Rel. Des. Luiz Lopes – j. 18.03.2011).

Quando do julgamento da Medida Cautelar na Reclamação de nº. 13145, que visava suspender a decretação de inconstitucionalidade da EC 62/2009 pelo TJSP, o Supremo Tribunal Federal dispusera o seguinte, sob a relatoria do Min. Cezar Peluso.

Se se prefere, impõe-se aos magistrados condicionar seus provimentos acautelatórios à presença, nos autos, dos requisitos da plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris) e do perigo da demora na prestação jurisdicional (periculum in mora), perceptíveis de plano (primo oculi, portanto). Não sendo de se exigir, do julgador, uma aprofundada incursão no mérito do pedido ou na dissecação dos fatos que a este dão suporte, senão incorrendo em antecipação do próprio conteúdo da decisão definitiva. 5. No caso, tenho como ausente o requisito da plausibilidade jurídica do pedido. É que o pronunciamento do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo pela inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 62/2009 se deu,incidentalmente, em pedido de intervenção estadual. E o fato é que todos os juízes e órgãos especiais ou plenários dos tribunais estão aptos a exercer o controle de constitucionalidade de emenda constitucional em face da Constituição Federal. A menos que haja -o que não se dá no caso dos autos -decisão com efeito vinculante deste Supremo Tribunal Federal em sentido contrário (a decisão na SS 4.010, além de não ter eficácia erga omnes, fundamenta-se em pressupostos processuais diversos daqueles que dão suporte à reclamação). A propósito, já proferi voto nas ADIs 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425, declarando a inconstitucionalidade do regime especial de pagamento de precatórios, instituído pela Emenda Constitucional nº 62/2009. Motivo mais do que suficiente para afastar a fumaça do bom direito. 6. Ante o exposto, indefiro a liminar, sem prejuízo, naturalmente, da posterior análise do Ministro-relator. 7. Solicitem-se informações ao reclamado. 8. Proceda-se, oportunamente, à distribuição do processo.” (STJ – Rcl 13145 SP – Rel. Min. Cezar Peluso – j. 02.02.2012). (grifos nossos)

Como mencionado no voto supra, de fato, estão em trâmite as ADIs de nº. 4.357[12], 4.372, 4.400 e 4.425, todas exorando a decretação da inconstitucionalidade – em controle abstrato – da EC 62/2009.

Na ADI 4.357, ad exemplum, observa-se a impugnação ao art. 100, § 9º da CF em tópico intitulado “meio coercitivo, ilegítimo e abusivo para a cobrança de tributos – violação aos direitos de liberdade, propriedade e igualdade e aos princípios da proporcionalidade e segurança jurídica”.

O Procurador-Geral da República, Ilmo. Sr. Roberto Gurgel, posicionara-se de maneira à decretação da inconstitucionalidade das inclusões feitas pela Emenda Constitucional 62/2009[13], acatando tanto os argumentos referentes à inconstitucionalidade formal como material. Em igual sentido, ressalte-se, o relator da ADI supra, Min. Ayres Britto, votara pela parcial procedência dos pedidos e a subsequente declaração de inconstitucionalidade da EC 62/2009 com as seguintes palavras:

A via crucis do precatório passou a conhecer uma nova estação, a configurar arrevezada espécie de terceiro turno processual-judiciário, ou, quando menos, processual-administrativo, com a agravante da não participação da contraparte privada (...) Depois de todo um demorado processo judicial em que o administrado vê reconhecido seu direito de crédito contra a Fazenda Pública (muitas vezes de natureza alimentícia), esta poderá frustrar a satisfação do crédito afinal reconhecido



A compensação de precatórios – créditos consubstanciados após o trânsito em julgado de uma sentença judicial – por débitos de seu favorecido ante o respectivo ente público, cuja certeza e liquidez dependera, ad primo, de simples apuração administrativa mediante lançamento e ulterior inscrição na dívida ativa é questão atual e de importância grandiosa nos âmbitos prático e teórico.

Enquanto a apuração do fato gerador e o cálculo do montante devido pelo sujeito passivo que, posteriormente, ocasionará no lançamento tributário são atos que não possuem o beneplácito do poder judiciário e, portanto, exigir-se por força legal e constitucional a compensação destes créditos fazendários – cuja certeza, mesmo quando esgotado o procedimento administrativo, ainda é passível de ser alvo de cognição judicial – é medida contrária aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, que preza pela igualdade, isonomia e moralidade pública.